Encolhimento das famílias reflete na busca por imóveis menores, afirmam especialistas
em O Dia, 27/junho
Tendência é impulsionada por mudanças demográficas, novas rotinas urbanas e condição financeira da população.
Cômodos pequenos, multifuncionais e integrados. Se antes o sonho da casa própria era um imóvel composto por vários espaços, amplo e capaz de acomodar toda a família com conforto, agora a realidade cabe dentro de uma kitnet de 40 m². Especialistas explicam que a transformação no perfil das moradias acompanha as mudanças no estilo de vida e na condição financeira da população.
De acordo com o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado do Rio de Janeiro (Sinduscon-Rio), Claudio Hermolin, a redução do tamanho dos imóveis tornou-se uma tendência, principalmente nos grandes centros urbanos, motivada por dois fatores principais: a diminuição do tamanho das famílias e a necessidade de reduzir os custos de manutenção.
O Censo de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra que os domicílios brasileiros têm hoje, em média, 2,79 moradores por residência — o menor número desde 1980, para quando há dados disponíveis.
"Há casos de pessoas que se divorciaram e procuram uma opção de moradia mais prática, adequada à sua nova realidade", explica Hermolin. "Na maioria das vezes, quem opta por esses apartamentos compactos são pessoas que estão iniciando a vida economicamente ativa, como aquelas no primeiro emprego, que estão saindo da casa dos pais ou se mudando para outra cidade em busca de oportunidades de trabalho."
Esse foi o caso de Caroline Belo, 27 anos, moradora de Copacabana, que se mudou para o bairro após iniciar sua segunda graduação, em Cinema, na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Antes disso, ela morava com a mãe em Paracambi, na Região Metropolitana.
"A minha mudança foi bem rápida. Eu precisava de um lugar para ficar sozinha e apareceu um imóvel bonito e recém-reformado em Copa", diz Caroline, referindo-se à sua kitnet de 37 m².
A estudante, que hoje faz mestrado na Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), pontua as vantagens e desvantagens de morar em um apartamento pequeno.
"O lado bom é que a limpeza é mais tranquila de fazer. Acaba sendo mais prático. A parte ruim, para mim, é que, se eu fico muito tempo em casa, me sinto sufocada, por lá ser muito pequeno", analisa. "A minha maior frustração é passar muito tempo sozinha. A solidão é bem ruim. Vira e mexe, preciso ’ver gente’ e sair com os meus amigos", diz.
Para que a diminuição do espaço dos imóveis não comprometa o bem-estar dos moradores, Valter Caldana, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, assegura que é preciso melhorar a qualidade da vida urbana.
"Nós precisamos buscar esse equilíbrio, elevar a qualidade de vida urbana para que os novos programas habitacionais, sobretudo nesse segmento, que é fundamentalmente ligado às classes médias e aos jovens, enfim, se tornem bons e adequados", destaca Caldana.
Além da procura tradicional para moradia, as kitnets têm grande demanda entre os investidores.
"Muitos desses clientes, que estão buscando esses imóveis, procuram para investimento, para uma renda passiva, para aluguel de temporada, e não só para moradia", comenta o corretor imobiliário Marcio Ornellas.
Sobre a valorização dos imóveis compactos, Pedro Gomide, sócio da Smart Leilões, empresa de hub imobiliário especializada em leilões de imóveis, destaca que, nas principais capitais, os imóveis de um dormitório vêm registrando uma valorização superior à dos imóveis com três dormitórios.
"Segundo dados do FipeZap de maio de 2025, imóveis de um dormitório têm se valorizado mais do que os de três dormitórios nas principais capitais, refletindo maior liquidez", diz.
Localização
Gomide ressalta que a tendência dos imóveis compactos, entre 35 m² e 60 m², está concentrada nas regiões mais valorizadas das grandes cidades, especialmente nos principais centros urbanos, como Rio de Janeiro e São Paulo, onde o metro quadrado é mais caro.
"Isso acontece por conta de uma combinação de fatores: custo total mais baixo, facilidade de financiamento, estilo de vida atual mais dinâmico e também pela atratividade desses imóveis para quem quer investir para alugar", pontua.
De acordo com ele, a procura por imóveis maiores permanece forte em "bairros tradicionais e bem estruturados".
"No Rio de Janeiro, regiões como Leblon, Jardim Botânico e Ipanema continuam atraindo famílias que valorizam espaço e conforto. Já em São Paulo, bairros como Moema, Morumbi, Alto de Pinheiros e Vila Mariana mantêm boa saída para imóveis maiores", explica.
Já o corretor imobiliário Marcio Ornellas observa que a tendência dos imóveis menores também é impulsionada pela grande oferta dessas novas construções.
"Principalmente entre as grandes construtoras, em determinados bairros como Barra Olímpica, Cidade Jardim e a região do Centro, da Gamboa, onde está concentrada toda a expansão imobiliária hoje no Rio de Janeiro, a maior parte dos imóveis lançados é de studios, quarto sala ou, no máximo, dois quartos", comenta. "Não necessariamente é o que o cliente busca, mas é o que a maior parte das construtoras, principalmente as grandes, está lançando."
Perfil dos apartamentos para compra e locação
Hoje, o tipo de imóvel que apresenta maior procura, tanto para compra quanto para locação, é o apartamento padrão, principalmente com área entre 61 m² e 90 m², aponta a 3ª edição do Anuário DataZAP, elaborado pela fonte de inteligência imobiliária do Grupo OLX. Entre os compradores, 41% buscam esse tipo de imóvel, enquanto entre os locatários esse percentual chega a 44%.
Em seguida, aparecem os apartamentos menores, com área entre 46 m² e 60 m², que são procurados por 40% dos interessados em aluguel.
"Quem busca imóvel para aluguel geralmente procura unidades menores, mais baratas e fáceis de manter. Por outro lado, quem está comprando para moradia própria tende a buscar algo maior, que ofereça mais conforto e atenda a um projeto de vida mais longo, como ter filhos, por exemplo", relata Gomide. Já o investidor, segundo ele, busca exatamente o oposto: unidades compactas, com alta liquidez e retorno rápido.
Dificuldade em vender imóveis grandes? Veja dicas
Para quem está com dificuldade de vender um imóvel grande, o gerente de Pesquisa e Inteligência de Mercado do Grupo OLX, Coriolano Lacerda, diz que o primeiro passo é identificar quem são os potenciais compradores.
"É importante conhecer e entender o perfil do público interessado em imóveis maiores, as motivações de busca e o que é relevante quanto às características e à localização da nova residência", avalia.
Para ele, além da estrutura do imóvel, o público-alvo dos imóveis com três ou mais dormitórios também valoriza aspectos relacionados à segurança:
"De forma geral, é preciso adequar a comunicação com anúncios completos, pois boas fotos, descrição do entorno e endereço completo podem fazer a diferença", menciona.
"Também vale considerar ajustes no preço conforme a dinâmica do bairro e melhorias estruturais que valorizem o imóvel."
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