O verde que vale ouro: o projeto de arborização que tornou Ipanema um dos bairros mais valorizados do Rio
em Diário do Rio, 19/outubro
O projeto do século XIX, inspirado nos modelos europeus de urbanismo, previa que cada rua tivesse uma identidade própria, com espécies de árvores escolhidas para uma espécie de assinatura de grife.
Há quem diga que o sol de Ipanema brilha mais bonito, mas a verdade é que o frescor que percorre suas ruas não vem apenas da brisa do mar. Parte do charme (e do metro quadrado mais disputado do Rio) se deve a um projeto de arborização centenário, concebido no início do século XIX, quando a região ainda era um imenso areal, e que transformou as calçadas em corredores verdes, sustentando grande parte da bossa do bairro.
Hoje, Ipanema é uma das regiões mais arborizadas da Zona Sul e essa cobertura verde faz diferença. Estudos do Observatório do Calor da UFRJ mostram que, comparando com bairros mais densos e menos arborizados do subúrbio, a diferença de temperatura pode chegar a impressionantes 11 °C. A brisa do Atlântico e a proximidade com o maciço da Tijuca ajudam, claro. Mas o que realmente faz do bairro um oásis urbano é o cuidado com o plantio das árvores desde o início.
A inspiração veio de modelos europeus de urbanismo do século XIX, que priorizavam a estética e o conforto climático. Em Ipanema, o traçado das ruas foi desenhado junto com a paisagem verde. E isso deixou marcas que atravessam o tempo.
Cada rua, uma paleta verde diferente
O projeto original previu que cada rua teria uma identidade própria, e as espécies de árvores ajudariam a reforçar esse caráter. Por isso, andar pela Barão da Torre, pela Redentor ou pela Nascimento Silva é quase como mudar de cenário. Cada via tem uma ambientação distinta, com copas, troncos e flores que criam um tipo de “assinatura” natural.
As ruas perpendiculares à praia (as que ligam a praia à Lagoa), por exemplo, foram arborizadas com a popular amendoeira da praia, também chamada de sete copas ou chapéu-de-sol. São árvores resistentes à salinidade, perfeitas para canalizar a brisa marinha que atravessa o bairro. Já nas paralelas, outras espécies foram escolhidas a dedo.
Nas praças, o desenho verde também foi pensado com rigor. A General Osório recebeu o ficus religiosa, enquanto a Nossa Senhora da Paz foi cercada de amendoeiras, o que dá a cada uma delas uma personalidade própria. Outras espécies encontradas pelas ruas de Ipanema incluem a cássia-de-sião, o flamboyant e figueiras asiáticas, como a benjamina. Todas exóticas, escolhidas em um tempo em que o foco era o embelezamento e o sombreamento, e não o uso exclusivo de espécies nativa, uma preocupação que só ganharia força décadas depois.
A batalha hoje é contra a descaracterização, vinda principalmente do plantio de espécies não incluídas no projeto original. Boa parte do traçado original, em alguns trechos, já não existe mais. Há alguns anos, uma doença atingiu as Cássias da Rua Barão da Torre, o que levou ao corte de inúmeras árvores.
Verde que vale ouro
A herança desse projeto vai muito além do visual. O frescor, o sombreamento e a qualidade ambiental se traduzem também em valorização imobiliária. Basta observar o chamado “Quadrilátero do Charme”, área nobre entre a Visconde de Pirajá e a Lagoa, onde as ruas residenciais mais arborizadas concentram os imóveis mais desejados e caros do bairro. O valor do metro quadrado em Ipanema é, em média, o segundo mais alto do Rio, atrás apenas do Leblon, girando em torno de R$ 23 mil. Como boa parte dos imóveis do perímetro tem plantas vantajosas, reflexo do boom de verticalização nas décadas de 70 e 80, uma transação imobiliária nesse trecho pode ultrapassar os R$ 6 milhões. Além disso, imóveis nessa localidade apresentam alta liquidez, com tempo médio de venda entre 60 e 90 dias e vacância inferior a 5%.
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